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Próximo da despedida


Timóteo, 10 de Maio de 2024.


Filho,


estou aqui na torcida de que você esteja bem. Independentemente de quanto tempo tenha se passado desde a escrita desta carta, tenho certeza de que sustento o mesmo desejo: de que esteja bem.


Eu o abracei pela última vez há três anos e uma semana. E penso que eu nunca mais terei a oportunidade de abraçá-lo novamente. Entretanto, eu não queria deixá-lo sem isso. Imagina se um dia você acorda e sente a vontade de receber o meu abraço? Eu queria deixar um que você pudesse receber e sentir.


Aqui há um abraço em forma de palavras. Palavras que abracem você com a intensidade de três anos e uma semana. Palavras que representarão os mesmos sentimentos pelo tempo que for possível. Mais três anos. Ou três décadas. Mais que isso eu não sei, meu filho.


Esta carta inaugura uma despedida. Uma longa despedida. Pois eu quero que você saiba que eu respeito você; e confio em sua capacidade de pensar, sentir e decidir por conta própria. Entretanto, filho, eu não contei tudo o que devia ter contado para você. Faltam muitas coisas a contar. Coisas que um pai deveria contar para um filho.


Eu ainda não tive tempo de aprender sobre todas as coisas que eu gostaria de contar. Ou sobre todas as coisas que eu gostaria de ensinar a você. Logo, eu continuarei a aprender e a contar para você por meio de cartas. Em algumas outras cartas. Não sei quantas. Afinal, talvez eu não aprenda tantas coisas mais.


Os últimos três anos e uma semana foram intensos. Eu tive que aprender sobre muitas coisas. Algumas das quais eu jamais pensei que fosse algum dia estudar e aprender. Aconteceu de hoje ter parecido tudo muito inútil. Conversei com algumas pessoas e recebi as mesmas opiniões: você e eu vamos continuar sem nos ver. Um reencontro parece ser só um sonho distante agora.


Sinto uma mistura curiosa de sentimentos. Alguma tristeza aparece porque eu tenho saudades. E eu tenho coisas para contar a você, lembra? Isso me deixa frustrado.


Ainda assim, eu quero contar para você sobre o sentimento de alegria que eu sinto. Pode parecer contraditório, mas é o sentimento de alegria que eu quero compartilhar contigo. O abraço em forma de palavras é cheio de sentimentos, mas é bem amarrado de alegria.


Eu senti alegria sempre que eu conheci pessoas especiais que me apoiaram para ver você novamente. Caso você seja pai um dia, saiba que existem pessoas especiais pelo mundo que estarão dispostas a apoiar você em sua paternidade. E se estiver em uma situação parecida com a minha; e seu filho ou filha esteja em uma situação parecida com a sua; ... Apegue-se a tais pessoas.


Em quase todos os dias dos últimos três anos e uma semana eu senti alegria. Nem que fosse por segundos. Eu senti.


Eu senti alegria sempre que houve alguma esperança de eu ver você na semana seguinte. Filho, era incrível imaginar o quanto poderíamos brincar, rir, passear, pedalar, conversar, rir novamente. Exceção aconteceu apenas por uns dois meses no início de 2023. Eu consegui um instrumento novo, atuar como advogado, e caí em uma imensa desesperança. Ali eu não consegui mais ver você em meu futuro. Eu só via a injustiça a que você estava submetido por todas as pessoas que deveriam proteger você.


Passados aqueles dois meses de tristeza profunda, eu só vi dias com pequenas flores de alegria. Tudo verdejante; um pouco primaveril. Quase voltei três anos e uma semana atrás quando eu, ignorante, nem sabia que não o veria novamente.


Hoje eu senti alegria quando comecei a escrever para você. Faz pouco tempo eu conversei com a sua Vovó Zizi. Compartilhei com ela o recurso judicial que planejo com os meus advogados e o infeliz resultado que eu imagino para o futuro: nunca mais o ver, apesar da tentativa. Entretanto, com ela mesmo eu tive a ideia de escrever para você. Filho, foi isso que me trouxe alegria.


Sinto muita alegria por ainda ter a esperança de que essa última carta chegue até você. Apesar de ter perdido a esperança de conviver contigo novamente.


Eu torço que esta aqui não seja a última carta que eu, seu pai, deixarei para você. Porém, não tenho como garantir muitas coisas, afinal.


Eis então uma carta de despedida que conta algo que eu sempre disse, desde antes de você nascer: eu o amo e sempre amei você.


Eis então uma carta de despedida que conta algo que só agora eu posso dizer: você continuará a ter um pai que deixará abraços para você receber e sentir quando precisar, se precisar.


Eis então cartas de despedida, não sei quantas, que contarão o que eu ainda não aprendi e por isso ainda não sei dizer: ...


Cartas do seu pai. Que algum dia você possa ler e lembrar: "CARTAS DO MEU PAI".


Pai do meu menino.


Cartas do Meu Pai, Carta 1.

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