Sítio Roberto Burle Marx, Rio de Janeiro, 01 de Junho de 2024.
Olá meu menino,
O dia está muito bonito desde cedo. E como eu quase não tinha o que fazer dentro de casa durante o feriado e o fim de semana, aproveitei para fazer uma trilha leve aqui perto.
Isso é algo bastante parecido com aquilo que já fizemos no passado: Caminhar ao ar livre, descobrir novos caminhos, olhar para todos os lados, respirar um ar mais puro, estar com quem se ama. Essas coisas fundamentais.
Já fizemos com a Vovó Zizi, inclusive, lembra? Tenho recordações em fotos e vídeos de várias delas.
Muitos caminhos nos quais eu imprimo os meus passos me fazem recordar de outros onde meus passos acompanharam os seus. Foram muitos os caminhos comuns. Entretanto, após mais de três anos de sua ausência, o número de caminhos sem você está para se tornar superior.
Escrever para você tem sido um exercício fascinante, filho. Pois eu me vejo calculando o que tenho feito sem você enquanto avalio o quanto ainda me lembro do passado. Realmente, o número de caminhos sem você só aumenta; damos cada vez mais passos para longe daquele passado onde você e eu estávamos juntos; e vamos em direção a um cume novo e desconhecido.
Afinal, nem sequer sabemos se estamos subindo encostas diferentes de um mesmo morro. Se estivermos no mesmo morro, nos encontraremos no cume em breve. Se estivermos em morros diferentes, serão dois cumes novos e desconhecidos. Desejo uma boa subida para você! Desejo uma vista deslumbrante para você!
De qualquer forma, eu não tenho me fixado no cume de qualquer morro, filho. Logo, ainda vou percorrer outras encostas. Em cada uma, vou me lembrar dos caminhos passados em que estive com pessoas que amo. Ao continuar em movimento, posso me reencontrar com quaisquer daquelas pessoas, inclusive com você. Será um prazer para mim ter a oportunidade de me reencontrar com você.
Em cada vertente, de cada morro, subindo ou descendo, estarei em casa. Se algum dia quiser caminhar com a minha presença, você sabe como me encontrar. Você e eu ainda podemos percorrer os mesmos caminhos. Juntos!
Ainda assim, pode ser que você decida que os nossos próximos caminhos não se cruzarão. Está tudo bem, meu menino. Por dez anos de sua vida, estivemos juntos. Eu me sinto grato por aquele tempo bem vivido, bem caminhado, bem contemplado. Eu me sinto cheio de boas lembranças. Também me sinto esperançoso de que eu tenha contribuído para que a sua vida seja plena. Não estivemos juntos muito tempo; nem pouco tempo; foi o tempo suficiente para continuar a caminhar.
Caminhe, meu filho. Apenas caminhe!
Como seu pai, quero contar que eu tenho absoluta convicção em sua capacidade para caminhar sozinho; para encontrar as pessoas que estarão pelo tempo suficiente ao seu lado; para encontrar os meios de deixar a marca do mundo e da vida em seu coração; para escolher como quer deixar a sua marca no mundo e nas pessoas que encontrará por aí; para fazer as suas próprias escolhas.
Tanta convicção tem um motivo: você já desenvolveu a capacidade de dar seus próprios passos.
Então, caminhe muito, meu filho. Apenas caminhe!
Abraços,
Do seu pai.
Cartas do Meu Pai, Carta 6.
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